O que move o futebol: amor ou dinheiro?
- Érica Karina
- 24 de jul. de 2023
- 4 min de leitura
No último ano perdemos grandes lendas do futebol. Nomes como Pelé, Roberto Dinamite e Gianluca Vialli estão em um emaranhado de lembranças e saudosismos. Esses saudosismos fizeram com que muitos de nós crescêssemos ouvindo histórias de ídolos de outras épocas. Eu particularmente cresci ouvindo as histórias dos grandes feitos de Renato Gaúcho que, meu pai tão orgulhosamente narrava. Cresci também ouvindo minha avó com certo tom de melancolia na voz expressar sua indignação: “Antigamente os jogadores tinham vontade, gostavam do time, hoje em dia é só por dinheiro”.
Muita coisa mudou desde a juventude até a senilidade de minha avó, hoje no auge dos seus 77 anos, porém futebol continua sendo futebol, assim como dinheiro continua sendo dinheiro. Talvez alguns se perguntem, o que meu breve relato sobre a indignação de minha avó tem haver com o que escrevo e então lhes respondo, absolutamente tudo.
Entre os comentários e histórias sempre me questionei como é possível o futebol ser um mercado tão lucrativo, no qual seu principal impulsionador é o dinheiro, não deveria ser o amor? Como dizia uma antiga professora do fundamental: “Quando o dinheiro sai pela porta, o amor pula a janela”, acredito que esse ditado “pegou” no mercado futebolístico.
Em vídeo publicado pela plataforma Kwai a página Cerrado Futebol, afirma que o astro David Beckham em sua primeira passagem pelo Los Angeles Galaxy em 2007, estipulou em seu contrato uma clausula que destinaria uma porcentagem dos lucros (como a venda de ingressos, camisas e bebidas por exemplo) ao craque. Ainda de acordo com a mesma página, no contrato o astro negociou um valor pré-determinado para uma futura compra de sua entrada para a MLS quando aposentasse as chuteiras, garantindo a Beckham a compra de uma equipe por US$ 25 milhões.
Segundo o site Futebol na Veia, com o plano de expansão da MLS em 2019, o St. Louis e Sacramento desembolsaram US$ 200 milhões e o Charlotte desembolsou uma quantia de US$ 325 milhões para que pudessem entrar na liga em 2022. Ao compararmos os dados apresentados podemos afirmar que foi uma jogada de mestre a de Beckham ao se transferir para a MLS, uma vez que sua chegada na liga a valorizou, atraindo um público maior para os estádios, assim como os investidores, e por fim ampliando o alcance de seu futuro investimento.
Diferentemente do que ocorre no futebol brasileiro no qual a grande maioria das esquipes são clubes associativos, a Major League Soccer (MLS) têm como principal característica o viés empresarial – comandada por um diretor executivo juntamente com um grupo de associados. De acordo com Paulo Pinto do Impactus UERJ, qualquer clube que tenha interesse de ingressar na MLS deve obrigatoriamente estruturar um plano de ação que apresente os benefícios de sua entrada na liga, assim como seja capaz de convencer que este será um bom negócio. O modelo no qual se estrutura a MLS tem por principal objetivo nivelar a competição esportiva, uma vez que ao exigir que cada equipe tenha seu próprio plano de ação, espera-se que as equipes tenham solidez e sustentabilidade financeira, já que esses itens são obrigatórios para que sua entrada na liga seja aprovada.
Além da diferença estrutural em relação a MLS e o campeonato brasileiro, podemos ver também outras diferenças, sendo a principal delas a aceitação de clubes de fora dos Estados Unidos na liga, como por exemplo o Toronto que passou a competir na MLS em 2007, porém, tanto as equipes nacionais quanto as estrangeiras seguem as mesmas exigências para a entrada na competição.
Outra diferenciação entre as competições e que provavelmente gera estranheza entre os fãs brasileiros é a inexistência da zona de rebaixamento que condiciona as equipes a disputarem outra série da mesma liga – o que define sua permanência na liga são os acordos empresariais entre as equipes e a gestão da MLS. Esta diferença entre a MLS e os outros campeonatos de futebol espalhados pelo planeta faz com que muitos torcedores não vejam a MLS como uma liga competitiva, uma vez que ao não existirem disputas para se manter na liga ou então uma grande ascensão no futebol nacional ou continental a competição pode ser considerada um tanto quanto desinteressante para alguns dos torcedores mais apaixonados. Da mesma forma, ela pode ser considerada por outros como apenas uma competição por dinheiro, sem muito a se importar com a beleza do esporte. Todavia, não podemos deixar de levar em consideração que a tradição existente na MLS não é a mesma tradição do futebol brasileiro. Contudo, as esquipes têm se mostrado cada vez mais empenhadas em despertar o espírito apaixonado e a identificação com o futebol.
O Orlando City permitiu que os moradores da cidade de Orlando tivessem uma identidade [...] essa construção de identidade se deu pela estratégia de marketing entre os parceiros e patrocinadores com o time, além do patrocínio de empresas locais da cidade como o plano de saúde Orlando Health, mercados da cidade utilizam a camisa roxa, cor do Orlando City, em dias de jogo. Essa estratégia permitiu com que os moradores de Orlando rapidamente simpatizassem com o time. (Paulo Pinto, 2020 – Impactus UERJ)
As iniciativas realizadas pelo Orlando City demonstram que os clubes que integram a MLS estão buscando soluções para chamar os torcedores para dentro dos estádios e vibrar juntos com as esquipes. Entretanto, esse não é um caminho fácil, pois o futebol tem ao longo de sua existência sido tratado como um fator cultural e não há como inserir uma nova cultura em um curto prazo de anos. Para uma sociedade adaptar-se a uma nova cultura ela precisa se afeiçoar a ela e assim assimilá-la e praticá-la.
Recentemente com a compra de Lionel Messi junto ao Inter Miami a MLS ganhou um novo destaque no mundo futebolístico. Acredita-se que com a chegada do craque o futebol se popularize ainda mais entre os americanos, assim como amplie e desenvolva o esporte no país. Contudo, a pergunta que ainda paira no ar é se tamanho esforço para a popularização do futebol estadunidense é com intuito de desenvolver a cultura futebolística ou é meramente com fins lucrativos? Isso meus amigos, deixo que cada um tire suas próprias conclusões.
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