A importância do acompanhamento psicológico para atletas profissionais
- Bárbara Jardim
- 21 de set. de 2023
- 4 min de leitura
Recentemente, na partida entre Brasil e Bolívia, o jogador Richarlison chamou atenção, não pelo que mostrou dentro de campo, mas sim, fora dele. No banco de reservas, o centroavante foi flagrado chorando, após a substituição.
Em entrevista, o atacante explicou estar passando por problemas pessoais fora de campo, que acabam afetando seu desempenho.
“Aquele momento triste não foi por eu ter jogado mal. A meu ver eu não fiz uma má partida lá em Belém. Foi mais mesmo um desabafo, pelas coisas que vinham acontecendo fora de campo, coisas que fugiram do controle... Agora vou voltar para a Inglaterra, procurar ajuda psicológica, procurar um psicólogo para poder trabalhar também a mente e voltar mais forte.”
Após o desabafo, o técnico do Tottenham Ange Postecoglou, garantiu prover ajuda ao atleta.
“Ele se emocionou depois de um jogo e está tudo bem. Providenciaremos todo o suporte que ele precisar. Tenho certeza de que todos os jogadores no vestiário estão lidando com alguma coisa, sempre existe algo que não está onde você quer. É uma questão de manter a perspectiva e o equilíbrio. Isso faz parte da vida”.
Thabata Telles, vice-presidente da Associação Brasileira de Psicologia do Esporte (Abrapesp), afirma que é relevante haver esse tipo de apoio por parte dos treinadores e companheiros de equipe, porém ele sozinho não é suficiente. Há necessidade do acompanhamento por parte de um profissional qualificado.
“É importante que os outros profissionais tenham boas capacidades de comunicação e bom manejo das relações interpessoais. Além da confiança e competência em seu trabalho, podem ter também uma escuta atenta e empática ao atleta. Porém, nada disso muda o fato de ser fundamental a presença de um psicólogo do esporte em todas as equipes, sejam elas de base ou profissionais, independentemente da modalidade”.

O apoio que Richarlison recebeu, surtiu efeito. No último sábado, 16, o jogador foi decisivo na partida entre Tottenham e Sheffield United. O atacante entrou aos 34 minutos do segundo tempo, balançou a rede com um cabeceio e deu assistência para o gol de virada, na vitória por 2 a 1.
O acompanhamento psicológico é essencial para os atletas e pode refletir no resultado em campo e fazer total diferença no desempenho. Thabata, explica a importância desse tipo de assistência na carreira dos atletas:
"Basicamente ela faz parte da preparação do atleta e é tão importante quanto o acompanhamento físico, técnico ou nutricional. Especialmente com relação à carreira, é fundamental para uma boa gestão da carreira e para viabilizar melhores tomadas de decisão que ocorrem ao longo de sua trajetória como atleta".
Apesar de mostrar-se importante e eficaz, o apoio psicológico não é oferecido por grande parte dos clubes. Apenas dez, dos vinte times da série A do campeonato brasileiro contam com esse tipo de suporte aos jogadores profissionais. Para Thabata, isso ocorre pois ainda há desconhecimento do que faz um psicólogo do esporte.
Atualmente, a lei prevê a obrigatoriedade de assistência psicológica apenas para as entidades esportivas formadoras de atleta, ou seja, apenas para atletas em formação, nas categorias de base.
Laryssa Cunha, é psicóloga pós-graduada em Terapia Cognitivo Comportamental com Crianças e Adolescentes e comenta que o acompanhamento psicológico deveria ir além da base.
"Eu acredito que muitos clubes contratam psicólogo apenas para cumprir a exigência e não serem punidos. E como não existe essa exigência no profissional, muitos clubes não têm psicólogo na comissão técnica. O ideal é que os clubes de futebol tenham psicólogos na base e no time profissional, mas não é o que acontece. Muitos acreditam que é só o jogador procurar um psicólogo fora do clube. Porém o trabalho do psicólogo do esporte no clube e nos consultórios é diferente".
Thabata complementa que o acompanhamento psicológico deve fazer parte do cotidiano do atleta e ao longo da sua trajetória, e não ser buscado apenas em determinados momentos... Precisamos conhecer a pessoa, fazer uma boa avaliação, entender o contexto e as demandas para desenvolver estratégias efetivas. Preparação nenhuma - seja ela física ou psicológica - acontece da noite pro dia e muito menos sem respeitar as especificidades da atuação”.
As punições para clubes que não cumprirem com a prestação de assistência psicológica para atletas em formação, incluem advertência, perda da certificação como organização esportiva formadora e suspensão da organização esportiva em competições oficiais.
Se apenas a exigência da lei consegue fazer com que os clubes implantem melhorias para o bem-estar dos atletas, é, portanto, indispensável, que haja obrigatoriedade do acompanhamento psicológico também para os jogadores profissionais. Um projeto de lei de 2012 tramita até hoje na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) com o objetivo de “dispor que é dever da entidade de prática desportiva empregadora submeter os atletas profissionais aos exames médicos e clínicos necessários à prática desportiva, bem como lhes garantir assistência psicológica continuada”.
Enquanto a lei não é aprovada, cabe às instituições esportivas o bom senso, a empatia e a busca por conhecimento acerca de quanto esse tipo de assistência pode beneficiar não somente aos atletas, mas aos clubes como um todo.
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