D’Alessandro: o futebolista em três atos
- Érica Karina
- 17 de abr. de 2022
- 4 min de leitura
Quando as lágrimas rompem o espaço e o tempo e é dado o último toque na bola, as últimas palmas da torcida, a última vez que se pisa em campo como jogador. É um misto de emoções e, eu enquanto torcedora colorada e fã do esporte, senti e sinto hoje esse misto.
Se passaram praticamente 14 anos desde a chegada de D’Alessandro ao Internacional e, desde então o vimos vestir e honrar a camisa colorada, transcendendo o significado do amor entre torcida e clube e, principalmente, o amor entre torcida e ídolo. Não sou colorada por causa de D’Alessandro, porém, aprendi a amar muito mais o Internacional por influência dele.
Nosso argentino encantou o coração dos colorados e mostrou que para ser um herói ou uma lenda, é preciso muito mais que apenas títulos e conquistas, é preciso amor e identificação, e isso D’Ale esbanjou durante cada dia e cada segundo em que defendeu as cores do clube do povo, por isso, o tchau é tão emocionante, tão especial e saudoso, sabíamos que esse dia em algum momento chegaria, todavia, não estávamos e, não estamos preparados para a despedida.
Na noite deste domingo (17), o confronto entre Internacional x Fortaleza marcará a despedida de Andreas Nicolas D’Alessandro dos gramados, independente do resultado do duelo entre as equipes, para os colorados, posso afirmar sem sombra de dúvidas, será um jogo eternizado em nossa memória, com uma carga emocional inexplicável, eu particularmente, lhes escrevo e as lágrimas teimam em cair antes mesmo do ato final.
Lembro-me perfeitamente de quando em 2008, os programas anunciavam a contratação de D’Alessandro e, sabem quando se está lendo um livro de romance e no nosso íntimo, mesmo antes do autor anunciar, já sabemos que há uma forte química entre os personagens? Ou quando assistimos uma série ou filme, e percebemos os entreolhares, sabemos que haverá uma história épica. O mesmo aconteceu quando D’Ale chegou ao Beira-Rio, a conexão foi imediata, como se fosse ontem, lembro de acompanhar sua estreia pela rádio gaúcha, pois na época, a internet ainda era para poucos e a televisão nacional clubista, privilegiando sendo o eixo Rio-São Paulo, mas sempre podíamos contar com a rádio.
Vibrei com o primeiro gol do argentino pelo Inter, o dia era 14 de setembro de 2008, em jogo válido pelo campeonato brasileiro, com gols de D’Alessandro e Alex, o Inter venceu o Botafogo por 2 a 1. Quatorze dias depois, o argentino marcava seu primeiro gol em um Gre-nal, no qual o Colorado venceu por 4 a 1. Ainda no mesmo ano o argentino foi decisivo para a conquista da Copa Sul Americana, onde o Internacional foi a primeira equipe brasileira em uma final e, respectivamente a primeira equipe brasileira a conquistar o torneio, tornando-se campeã de tudo. Em nosso centenário (2009), D’Ale já era peça importante e, no mesmo ano, na emocionante jornada em busca pelo título da Copa do Brasil, ele mostrou toda sua garra, lutando bravamente pelo Inter em cada duelo, e mesmo com o vice campeonato, clube e jogador foram fantásticos.
Épica, é a palavra para definir a conquista da Copa Libertadores da América em 2010, épico, também define D’Alessandro naquela temporada, eleito “Rei da América”, já não se podia negar, o coração do argentino era colorado. A conquista da América, foi um dos momentos mais emocionantes na história de alguns colorados, já que muitos, como a minha geração, pouco lembrava das conquistas de 2006. A taça Libertadores, foi uma das primeiras vezes que D’Alessandro nos fez cair em lágrimas. Qual era o diferencial do craque argentino entre tantos outros jogadores? A mesma pergunta me faço hoje, passados quase 12 anos, e a resposta me parece cada vez mais simples, é o amor que o craque demostrou em cada momento junto ao clube.
Como disse anteriormente, a conquista da América, foi uma das primeiras vezes que D’Ale nos fez cair em lágrimas, o primeiro ato. Pessoalmente, um dos momentos mais marcantes em minha memória ocorreu no início de 2014, nesse momento, o argentino já tinha se consolidado como ídolo, já havíamos visto e nos apaixonados por inúmeras “la boba”. Mas em 2014, uma proposta da China ameaçava tirar nosso craque, quando ouvi a noticia pela rádio gaúcha, estava em meu quarto, e senti um aperto no peito, pensando que ainda D’Ale e Inter tinham um caminho de muitas vitórias pela frente, e naquele instante não poderia fazer nada além de chorar e sentir a dor da possível perda, mas graças ao bom senso, a diretoria fez com que D’Ale permanecesse no clube.
Na desastrosa campanha de 2016, que causou ao Colorado o rebaixamento à segunda divisão do campeonato brasileiro, não contávamos com D’Ale. Diferenças a parte, no ano seguinte, quando o Inter precisava de um líder, de alguém com identificação e, que não temeria a peleia que iríamos enfrentar, o argentino voltou e se doou de corpo e alma para restituir ao Clube do Povo os dias de glória.
Novamente no final de 2020, devido a algumas diferenças, D’Ale deixou o Colorado, transferindo-se para o Nacional do Uruguai na temporada 2021, com um até breve. Mesmo sabendo que o craque voltaria, a dor era inenarrável, pois sabíamos que a carreira do craque estava se encaminhando para seu final, os até breves eram o segundo ato.
Não sabíamos se veríamos D’Ale novamente como jogador colorado, ou se estaria ao lado do campo, como membro da comissão técnica, ou membro da diretoria, mas para a nossa sorte, D’Ale escolheu voltar e ao lado do torcedor colorado encerrar sua carreira como jogador. E hoje, dia 17 de abril de 2022, dois dias após seu aniversário, aos 41 anos, diante de mais de 30 mil torcedores colorados, o argentino despede-se do futebol seu terceiro ato. D’Ale encerra uma carreira de luta, tropeços e vitórias, uma carreira grandiosa e épica.
Pelo Internacional foram mais de 500 jogos, 95 gols, 113 assistências e 13 títulos conquistados, marcas de um craque imortal, que eternizou seu nome na memória dos torcedores e na história do futebol. Falar de D’Alessandro é falar de amor, raça, entrega e magia, magia essa que somente os amantes do futebol conseguem entender.
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